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segunda-feira, 5 de março de 2012

Escassez de professores no Ensino Médio: Um relatório do Conselho Nacional de Educação (CNE) – Parte I

“Países como Argentina, Chile e México investem mais do o dobro investido no Brasil no Ensino Médio. Ou seja, independentemente do país, nesse campo inexiste mágica: não há como melhorar a qualidade do ensino sem que haja investimento adequado.”
Trecho do relatório do CNE

No dia 03 de julho de 2007, o Notícias Terra publicou a matéria “Ensino médio: pode faltar professores em 10 anos”, informando que o então Ministro da Educação, Fernando Haddad, recebeu nesse dia, do Conselho Nacional da Educação (CNE), em Belém (PA), um relatório elaborado com base em dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep/MEC), pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Segundo a reportagem, Antonio Ibañez Ruiz, membro da Câmara de Educação Básica do CNE e um dos autores do relatório, afirmou que “o MEC deve assumir a responsabilidade pelo problema, por ele chamado de ‘apagão escolar’, pois essa falta de professores já é uma realidade há pelo menos 20 anos” (isso em 2007). Mais do que os problemas que o Ensino Médio brasileiro enfrenta, o relatório traz dados educacionais de outros países, compara com os brasileiro e aponta medidas emergenciais para começar a solucionar o problema.
Mesmo tendo conhecimento desses problemas, desde meados de 2007, o então Ministro da Educação Fernando Haddad anunciou, no dia 21 de setembro de 2011, mais de quatro anos depois, pretender um amplo debate sobre os resultados de uma pesquisa científica por ele encomendada, sobre a correlação entre o número de horas que o aluno passa na Escola e o seu Rendimento Escolar e propunha, na época, o aumento da carga horária educacional de 200 para 220 dias letivos, conforme a publicaçãoEducação: Brasil x Chile? Fala sério, Haddad!. A “solução mágica” de Haddad, como já afirmávamos na ocasião, é a confirmação do que vimos afirmando: a Educação em nosso país é prioridade apenas no discurso. Haddad desconsidera muitas das propostas do próprio estudo por ele encomendado e do relatório Escassez de professores no Ensino Médio: propostas estruturais e emergenciais do CNE, que pode ser encontrado em sítios oficiais como Portal do MEC e Senado Federal, bem como no sítio Todos Pela Educação. Por ser extenso e conter muitas informações importantes, faremos três publicações de análise desse Relatório. Vamos à primeira parte:


A Introdução
O relatório do CNE afirma que há muitos anos o Ensino Médio é a exigência mínima para o ingresso na maioria dos postos de trabalho dos países de economias consolidadas. Informa ainda que dados do Banco Mundial mostram que quatro anos de estudo ampliam em 33% a renda de um trabalhador; oito anos, 55%; já doze anos, a renda alcança 110%, mais que o dobro da renda de quem não tem nem mesmo o primário completo. Aponta que para os países membros da OCDE, a média da população entre 25 e 64 anos de idade que já concluíram o Ensino Médio é de 41%; em 21 desses países, mais de 60% já concluíram; países como Alemanha, Japão e Estados Unidos, ultrapassaram a marca dos 80%; na América do Sul, Chile atingia 49%, Argentina 42% e Brasil... apenas 30%, como mostra a Tabela 1, extraída do Relatório do CNE.

Com base nesses dados, o relatório propõe, além da ampliação das vagas no Ensino Médio regular, a criação de programas de Educação de Jovens e Adultos (EJA).
Outro dado importante vem de um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), que mostra que, em 2004, 82,2% dos jovens de 15 a 17 anos frequentavam a escola, mas somente 45,1% deles estavam no Ensino Médio, o que demonstra grave defasagem na relação idade/série. Esse mesmo estudo mostrou uma estreita relação entre a frequência do Ensino Médio e a renda familiar: em 2005, dos jovens desta faixa etária, os pertencentes ao 1º quinto de renda correspondiam a apenas ¼ dos pertencentes ao 5º quinto superior de renda, revelando ainda, as desigualdades regionais, conforme a Tabela 2, também extraída do Relatório, como todas as Tabelas aqui exibidas.
Ainda segundo esse estudo, em 2005, os jovens das áreas rurais correspondiam à metade dos jovens de áreas urbanas não metropolitanas, devido à falta de transporte escolar e a pouca qualidade da oferta existente.
O relatório verificou que, entre os anos de 1995 e 2005, houve uma queda nas matrículas do Ensino Médio nas regiões mais desenvolvidas, mas apesar disso, no país, houve crescimento que não foi acompanhado pela melhoria da qualidade, como mostram os resultados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb/2003), que mostrou que 44,3% dos alunos da rede pública se encontravam nos estágios de aprendizagem Muito Crítico e Crítico, contra 10,7% dos alunos da rede privada. O relatório situa essa baixa qualidade do ensino público como um dos fatores dos quase 14% de abandono escolar e dos 10% de repetência da época. A tabela 3 mostra o desempenho na disciplina Língua Portuguesa, mas o relatório diz que o desempenho em Matemática foi semelhante.

Da Importância do Financiamento
O estudo aponta ainda a falta de financiamento como fator preponderante pela falta de acesso e permanência do aluno do Ensino Médio da segunda metade da década de 1990 até a primeira metade da década seguinte, citando o fato de que, até 2003, esse aluno não recebia livros didáticos, passando a recebê-los, de forma discreta, a partir do ano seguinte: apenas nas disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática. Pela Tabela 4, podemos verificar o investimento de alguns países na Educação Básica. Podemos notar que nosso país investe muito pouco.
Nesse ponto, transcrevo, na íntegra, o que diz o relatório no tocante ao investimento no Ensino Médio e a Tabela 5, com o resultado do Programa Internacional de Avaliação de Desempenho (PISA):

A verdade é que os países de economias consolidadas investem por aluno/ano, em média, algo em torno de US$ 7 mil na Educação Básica – e são países que estão muito à frente do Brasil, que se encontra em último lugar, como indicam os resultados do Programa Internacional de Avaliação de Desempenho (PISA), aplicado para jovens de 15 anos, nas disciplinas de Língua Portuguesa, Matemática e Ciências. A tabela 5 mostra resultados do PISA para alguns países e o investimento médio de cada um na Educação Básica. Países como Argentina, Chile e México investem mais do que o dobro investido pelo Brasil no Ensino Médio. Ou seja, independentemente do país, nesse campo inexistem mágicas: não há como melhorar a qualidade do ensino sem que haja investimento adequado.
As perguntas que ficam são:

Se desde de julho de 2007 o então ministro Fernando Haddad já tinha conhecimento da situação precária do Ensino Médio brasileiro; se desde esta data o CNE já alertava para o fato de que outros países como Argentina, Chile e México investirem mais do que o dobro que o Brasil investe na Educação Básica; se o relatório já alertava para a “inexistência de mágica para a Educação, que não há como melhorar a qualidade do ensino sem investimento adequado, por que em setembro de 2011 (quatro anos depois), Haddad propôs a mágica de aumentar apenas o tempo de permanência do aluno na escola para melhorar a qualidade do ensino público, comparando, nesse aspecto, o Brasil com o Chile, conforme mostramos na publicação Educação: Brasil x Chile? Fala sério, Haddad!?

Não há interesse em resolver os problemas da Educação do brasileira?

Até quando Educação Básica e a Valorização do Magistério serão prioridade somente no discurso?

E cadê a verba do Pré-sal para a Educação?

Ficam esses questionamentos para reflexão e debate social, como propôs Haddad, se assim o leitor o quiser.

Porém o Brasil deu um importante, mas insuficiente passo para reverter a situação: a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB). O Relatório o apontou como importante ferramenta para o desenvolvimento do Ensino Médio, passando pela melhoria do pagamento do salário do professor, pois previa um grande avanço na contribuição do governo federal no financiamento da Educação Básica do país: 10% com o FUNDEB, contra apenas 1,5% do FUNDEF. Mas o que revela o Relatório, o que qualquer pessoa de bom senso poderia dizer e que, ao que parece, o então Ministro parece até agora não saber, é que a falta de investimento na Educação Básica leva à baixa remuneração do professor e tem reflexo direto na baixa qualidade do ensino brasileiro, levando a um número cada vez menor de jovens à procura de cursos de licenciatura e provocando um outro grave e, possivelmente, mais importante problema para o enfrentamento da baixa qualidade do ensino: a escassez de professores no Ensino Médio, especialmente nas disciplinas das ciências exatas e da natureza, mais precisamente em Química, Física, Biologia e Matemática.

Daremos continuidade à análise desse Relatório nas próximas publicações, onde aprofundaremos a questão da escassez de professores no Ensino Médio, já na próxima publicação, observando dois pontos cruciais para o enfrentamento desse problema: a questão da remuneração e da formação de professores.

Na terceira e última publicação de análise desse Relatório, trataremos das conclusões, soluções e proposições apontadas pelo Relatório, e faremos uma análise crítica sobre o que efetivamente foi acatado pelo então Ministro Haddad e realizado em prol da melhoria da Educação de nosso país.

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